Depois do choque que foi a pandemia, que marcou os últimos dois anos, esperávamos que a economia pudesse curar feridas e retomar o crescimento sem interferências de maior. Mas, em fevereiro, a invasão da Ucrânia pela Rússia trouxe-nos a notícia de que afinal não iria ser assim. Para além do imenso dano humanitário para os ucranianos, temos um novo desafio pela frente, fruto em boa medida do choque energético originado pelo conflito: a inflação e as inevitáveis consequências nocivas para as economias e as sociedades.
Agora que, infelizmente, este termo promete estar presente no nosso dia-a-dia (e no nosso bolso) por tempo indeterminado, é importante relembrar de que estamos, afinal, exatamente a falar.
A inflação consiste no aumento generalizado dos preços dos bens e serviços. Quanto maior a subida de preços, menos se consegue comprar com o mesmo dinheiro, ou seja, menor o poder de compra. No final do dia, é o valor de uma moeda que está em causa quando falamos de inflação.
Quando se fala de aumento generalizado dos preços, quer-se dizer, por um lado, que não se trata de uma subida pontual de um tipo de produto específico ou num dado setor, mas de uma tendência geral de evolução de preço. Tal significa que se trata de um comportamento dos preços que tem uma grande influência no consumo das famílias.
No cálculo da inflação, têm maior peso (ponderação) os preços dos produtos em que se gasta mais dinheiro, como é o caso da eletricidade, por oposição a bens menos essenciais, como, por exemplo, selos de correio ou o açúcar.
Para o cálculo mensal da inflação é considerado um ‘cabaz’ de artigos que se mantém, para que o seu custo possa ser comparável e por forma a espelhar aquilo que são os reais hábitos de consumo das famílias num dado país. A taxa de inflação homóloga será, assim, o preço do cabaz completo de um dado mês, quando comparado com o custo desse mesmo cabaz no mesmo mês do ano anterior. E permite-nos, assim, perceber se, um ano depois, conseguimos, com o mesmo dinheiro, adquirir mais ou menos bens e serviços do que doze meses antes.
Em Portugal, assim como no resto da zona euro, o cabaz considerado para o cálculo da inflação inclui aproximadamente 700 produtos e serviços, que espelham a despesa feita, em média, pelas famílias. Neste conjunto estão incluídos artigos do dia a dia, como produtos alimentares ou combustível, bens duradouros, como vestuário ou eletrodomésticos, e serviços como rendas de casa ou cabeleireiro. Cada bem ou serviço tem um preço, que pode variar, e a respetiva ponderação, de acordo com a importância que assume, em média, no orçamento das famílias.
Uma vez que nada é estático, tão pouco o cabaz considerado para efeitos de cálculo da evolução dos preços o é. Para que se mantenha atual, a sua composição e respetivas ponderações podem ser alteradas sempre que a realidade o exija.
A inflação dos preços no consumidor na zona euro é calculada mensalmente pelo Eurostat, o gabinete de estatísticas da União Europeia, sob a denominação de Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC). É harmonizado porque todos os países utilizam a mesma metodologia de cálculo, por forma a que seja possível uma comparação não só de períodos homólogos, mas também entre estados-membros.
O Banco Central Europeu considera que, para que exista uma estabilidade nos preços, a inflação deve permanecer baixa e previsível em torno dos 2% a médio prazo. O que se passa hoje no espaço europeu está longe desse cenário ideal.
Em concreto, e no que diz respeito a Portugal, os últimos números divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), relativos a agosto, revelam que a inflação está atualmente nos 9% em termos anuais. Já quanto ao IHPC, o país está nos 9,5% de inflação, ou seja, acima dos 9,1% da média da zona euro.
E, ainda que os números do INE mostrem um abrandamento muito ligeiro em relação a julho – altura em que estava nos 9,1% -, continua em valores nunca vistos nas últimas três décadas. E, apesar deste aligeirar em agosto, desde setembro de 2021 que a inflação homóloga mensal tem subido consecutivamente. E essa tendência está para ficar.
A variação homóloga do índice relativo aos produtos energéticos está atualmente acima dos 20%. Nos produtos alimentares não transformados, a variação está já acima dos 15%. A alteração dos preços nestes dois grupos de produtos destaca-se nesta altura pelo impacto enorme na taxa de inflação. Mas há também um efeito indireto que já se faz sentir noutros bens e serviços, fruto, nomeadamente, do encarecimento dos custos de produção que aquelas subidas de preços provocam.
Numa altura em que não se vislumbra um fim para o conflito na Ucrânia e em que a aproximação do inverno na Europa antecipa uma pressão acrescida sobre os produtos energéticos, a inflação promete continuar na agenda durante um bom tempo.
2022-10-21