Tanto nos maravilha e fascina como nos assusta e deixa assoberbados. A Inteligência Artificial (IA) tem vindo a trazer enormes mudanças às nossas vidas, da economia à sociedade, com impacto nos comportamentos, hábitos, formas de funcionar e até de pensar. Há muito que deixou o mundo da futurologia, estando já presente em todo o lado, por vezes de forma tão subtil que nem nos damos conta.
A inteligência artificial é a capacidade de uma máquina ou sistema replicar o comportamento humano na realização de tarefas, com recurso ao reconhecimento de padrões e realização de inferências programadas, e através do tratamento de dados.
Não se trata de uma única grande tecnologia, mas sim de um conjunto de diferentes tecnologias desenvolvidas por pesquisadores, empresas e comunidades online. Estima-se que, só em 2021, o investimento em IA tenha ultrapassado os 170 mil milhões de dólares (cerca de 156 mil milhões de euros).
Não existe, no entanto, um consenso global quanto aos benefícios e riscos da IA. Nos dois extremos opostos estão os que acreditam que o uso desregulado e indiscriminado da tecnologia de inteligência artificial traz muitos riscos e, do outro lado, os que defendem que existe algum exagero.
Para os primeiros, a IA está a enfraquecer a interação pessoal, a estrangular a criatividade e a perverter a política. E temem que, quanto mais sofisticada ficar esta tecnologia, maiores os danos que pode causar. Os segundos consideram que, ao enfatizar-se a ideia de que é algo que pode sair do controlo humano, desresponsabiliza-se quem faz uso da IA, caso das empresas e outras organizações. Entre estes dois extremos, muitos reconhecem as vantagens, por exemplo para as empresas, no incremento da produtividade, aumento da eficiência, melhoria do atendimento, reforço da eficácia na deteção da fraude e gestão de stocks e entregas. Os consumidores ganham em conveniência, rapidez e maior personalização. A IA ajuda-nos a traduzir idiomas, automatizar tarefas domésticas, evitar engarrafamentos, criar conteúdos, negociar ações, criar planos de dieta personalizados, desenvolver veículos autónomos, ter aplicação na saúde ou conseguir navegar na Internet de forma muito mais facilmente direcionada para o que nos interessa.
No entanto, o facto de se tratar de um universo muito novo e em que muitas mudanças estão a acontecer em tempo real faz com que existam ainda muitas incógnitas.
Um dos desafios mais importantes está relacionado com a ameaça que a IA constitui para milhões de postos de trabalho em todo o mundo, cujo impacto se calcula que vá ser incomensuravelmente superior ao que a revolução industrial teve no seu tempo. Inúmeras tarefas desenvolvidas previamente por seres humanos passam a poder ser feitas por máquinas. Profissões como as de jornalista, designer, engenheiro, programador e tantos outros podem ter os dias contados, preveem alguns analistas.
É certo que, em paralelo, têm surgido novas profissões e novas necessidades para as quais é preciso mão-de-obra. E isso permitirá compensar – pelo menos em parte – a perda de postos de trabalho.
Para os mais acérrimos defensores das novas tecnologias, a resposta à IA está na adaptação. Há que encontrar formas de trabalhar e tirar partido destas novas ferramentas, sob pena de ficarmos para trás e acabarmos, efetivamente, por ser substituídos. Mas muitos são aqueles que já estão há muito no mercado de trabalho e que não terão o tempo nem a capacidade para se adaptarem aos novos requisitos.
De entre todas as inovações que a IA tem gerado, há uma que tem trazido particulares reservas: o processamento de linguagem natural (PLN). Esta ferramenta ajuda os computadores a entender, interpretar e manipular a linguagem humana.
As pessoas interagem diretamente com grandes modelos de linguagem que dão respostas automáticas a e-mails e melhoram resultados de pesquisa, mas que também permitem que as pessoas façam perguntas ou solicitem que o sistema escreva tudo, de poemas a programas. No fundo, são programas que procuram simular seres humanos na interação com os utilizadores (chatbots).
Em novembro do ano passado, a OpenAI lançou o ChatGPT, que veio com a promessa de conseguir responder a quase tudo, através de uma utilização segura e sem danos, mas que tem trazido muitas reservas. Trata-se de um chatbot desenvolvido com IA, gratuito, e que permite gerar respostas face a pedidos dos utilizadores. Pode escrever artigos, ensaios, poesia, argumentos para filmes, música ou mesmo resolver problemas de codificação em apenas alguns minutos. O ChatGPT procura informações na Internet através de um modelo preditivo criado através da exposição a um limite sem fim de dados.
Apesar do seu desempenho impressionante e do seu caráter aparentemente inofensivo, esta ferramenta de IA está a preocupar académicos e especialistas, havendo mesmo quem refira que, em termos evolutivos, não estamos ainda preparados para este tipo de tecnologia. Um dos receios está relacionado, claro, com a possibilidade de ser mal utilizado.
Podemos não ser capazes de detetar uma falsa ‘expertise’, por exemplo. Distinguir entre o que é conhecimento especializado e de quem é especialista e o que são apenas conteúdos gerados por uma ferramenta de IA pode tornar-se cada vez mais difícil, com todos os riscos de fraude e manipulação que tal comporta. As ferramentas de IA podem também ser usadas para personificar celebridades, políticos e figuras públicas.
Acresce que o ChatGPT é apenas um protótipo. Outras versões mais atualizadas virão e a concorrência da OpenAI também está a trabalhar em alternativas. À medida que a tecnologia for avançando, mais dados serão adicionados e mais sofisticada a mesma se irá tornar. Se pensarmos que este tipo de tecnologia se está a desenvolver mais rapidamente do que a maioria das pessoas tem capacidade para entender, a vulnerabilidade dos indivíduos à desinformação e manipulação é potencialmente gigante.
Há quem considere que o discurso de que a IA é realmente capaz de nos superar e dominar o mundo é manifestamente exagerado e digno de filmes de ficção científica, não da vida real. Os sistemas de IA podem fazer apenas o que seus criadores permitirem, sendo, por isso, importante apontar agulhas às empresas, que não se podem desresponsabilizar. São estas que definem as regras, prioridades e valores por que guiam a sua atividade, ainda que com a ajuda de ferramentas de IA.
Muitas organizações têm vindo a desenvolver os seus próprios códigos de ética de IA, diferentes entre si, ainda que alguns princípios sejam, por regra, comuns, como é o caso da justiça, não maleficência e aplicabilidade. Só que vários especialistas lembram que, quando se trata de empresas com fins lucrativos, as equipas de gestão terão sempre de adequar as suas políticas aos objetivos do negócio.
É também por isso que muitos defendem ser fundamental regulamentar o uso da IA por parte das empresas e outros agentes. E fazê-lo o quanto antes, de forma proativa, não reativa, sob pena de, depois, ser tarde demais.
2023-04-17